domingo, 17 de janeiro de 2010

Quando a tragédia convida ao humano


Uma catástrofe abalou um país por inteiro. Entre 50 e 100 mil pessoas faleceram, dizem estimativas. Como o corpo humano é algo frágil, vulnerável, cerca de 3 milhões foram atingidos, de acordo com a Cruz Vermelha. Os números são imprecisos, pois o caos é tão forte que não há como afirmar nada com um mínimo de certeza. O desastre foi enorme e os desdobramentos são muitos, mas um movimento me chama a atenção de maneira especial. É o convite trágico que ecoa por todo o mundo depois da notícia do terremoto.



O terremoto mesmo já passou. O problema agora é lidar com os milhões de desabrigados, com a falta de acesso a saúde, com a escassez de alimentos e água, e com a violência. Mas olha só que coisa interessante eu acabei de escrever sem querer: o terremoto, que é a novidade, já acabou. Agora olhe para os problemas que eu listei. O que há de novidade neles?

Os problemas que hoje são notícia no Haiti são antigos naquele país, assim como no Brasil e em vários países do mundo. E há séculos a coisa é assim. Mas então, o que foi que fez tudo parecer diferente essa semana? O terremoto é uma das respostas. A outra é a concentração e a intensidade com que tudo apareceu. De uma hora para outra, em menos de um dia, 50 mil mortes num pequeno país esquecido, por uma causa natural, um terremoto imprevisível. Junto com as mortes, outros milhares de feridos e soterrados, e milhões de pessoas ficaram sem teto.



Qualquer um sabe hoje essas cifras do Haiti, pois elas estão pipocando em jornais de todo tipo. Mas eu aposto se alguém se lembra que a estatística de mortes, só pela fome, gira em torno de 25 milhões de pessoas por ano no mundo; que o número de indigentes e miseráveis no mundo é de quase 2 bilhões; e que só no Brasil, ano a ano, mais de 120mil crianças com menos de um ano de idade morrem de fome ou causas equivalentes. Nem eu me lembrava de cor. E nessa semana, os problemas que antes eram um problema global pareceram se concentrar por inteiro no Haiti. E a tragédia do terremoto fez o seu convite.

Convidou as pessoas a olharem para um país subjugado. Um país que não tem pernas sequer para lutar pela paz, e a ONU tem mandar militares (?) para que a paz aconteça. A miséria desencadeada por um chacoalho de Gaia foi tão intensa, e o cenário é tão horrível, e as imagens e os números batem com tanta força, tanta força, que as pessoas foram convidadas a despertar o seu lado humano que andava adormecido. A solidariedade e empatia de voluntários reacenderam, aquele que se sentia um inútil por ali foi chamado a prestar uma ajuda de ouro. Gisele Bündchen doou um de seus vários milhões. Assim fez também Sandra Bullock, Federer, o tenista, organiza partidas beneficentes, e milhares de ricos ao redor do mundo pegaram uma parte de suas economias para fazer o que raramente costumam fazer, dividir um pouquinho de seu excedente com quem não tem nem para sobreviver. Até o Governo do Brasil, que mal dá conta de seus famintos e desabrigados, e nem das tragédias naturais como a de Angra que ano a ano se repetem nessa época, tão previsíveis quanto o nascer do sol de manhã, arranjou nada menos que 15 milhões de dólares para sair bonito nos jornais.



No sacudir daquela terra, ruiu uma loja de artigos de luxo, de coisas para os barões de lá. Mas o que importa agora as quinquilharias de luxo, se o filho dono está com a perna soterrada num bloco de concreto quando ia à padaria? A tevê de Lcd e o moderno computador de um barão se salvaram do acidente. Mas e daí, se as pessoas com quem ele amava utilizar essas coisas desceram à força pra debaixo da terra? E o que é pior, ele gastou tanto o seu tempo adquirindo e ostentando esses bens que acabou ficando cego para o valor daqueles com quem dividia a vida. Hoje impera o medo no Haiti, comerciantes temem ser saqueados. Mas o que importa agora? Um homem com faca enfrenta um com outro com pau na disputa pelos restolhos que encontraram em baixo de um escombro, relata um repórter da Folha de São Paulo. Será que nem assim se consegue aceitar o convite, se consegue enxergar que é o outro a chave da reconstrução, e não da destruição? O convite ecoa, mas se os gestos de solidariedade se resumirem apenas a dias de terremotos, enchentes ou desabamentos, a (des)humanidade continuará a caminhar como está.



segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Quem são vocês? Apresento-lhes o Movimento Pró-Corrupção

Eles não tem nome nem rosto. Não declaram de onde vieram, e não se sabe onde querem chegar. De longe é possível vê-los chegando aos montes: são periquitos? É a mancha verde? Não... é só a galerinha do Movimento Pró-Corrupção...

Alguns o chamam de Arrudistas, outros de Pró-Arruda. A mídia, por exemplo, oscila entre essas duas denominações. Mas vamos lá, acho que o papel do Carta Desmarcada é de fato desmarcar certas velhas cartas. É claro que é conveniente centralizar o atual drama distrital na figura de um homem. É mais fácil, pois sempre tem aqueles que gostam e não gostam de uma figura importante. Mas importante mesmo é deixar claro que a luta travada hoje no DF não gira em torno disso.

O movimento fora Arruda e toda a máfia não é exatamente contra ou a favor de ninguém. Apenas exige a saída imediata das pessoas que pegaram dinheiro imundo, roubaram, mentiram e outros crimes mais. O atual governador do DF é o grande ícone de tudo isso, seguido pelo seu vice e pelo presidente da Câmara Legislativa do DF. A queda de Arruda é quase como a queda do rei em um jogo xadrez. Quase... Na batalha da vida real, é necessário que cada um desses nomes seja derrubado também para a vitória completa. Mas não é contra estes ou contra aqueles que somos. Somos a favor do Povo. É que somos o próprio povo e todo e qualquer corrupto é também nosso opositor. Somos um movimento contra a Corrupção. As pessoas envolvidas com ela são apenas as rodas que a fazem girar sobre a nossa dignidade.

Por que o movimento contra a corrupção é fora Arruda? Ele é fora Arruda – e a máfia toda – por que eles são os vetores da corrupção. Se foi Arruda, Fora Arruda! Se foi P.O, Fora P.O! E se foi Roriz, Fora Roriz!

A questão não é o fulano. A questão é aquilo que é público. E em favor do que é público se levantaram mulheres e homens, trabalhadoras, desempregados, estudantes, religiosos, e todos aqueles que não se conformam com a absurda pilhagem do dinheiro de todos. E é em nome de todos a luta – inclusive dos coitados obrigados a marcharem em favor de corruptos.

O movimento contra Arruda é, na verdade, um movimento contrário à corrupção. Mas, assim sendo, o que significa então um movimento que é ‘Pró Arruda’!?

















E espero que tenham gostado da nova aparência do Carta. Independente da aparência, a essência do conteúdo permanece a mesma. Abraços.

domingo, 3 de janeiro de 2010

Gafe? Desculpas? A diarréia de Boris Casoy

Asco, nojo, ojeriza. Eu senti ânsia de vômito quando assisti a esse vídeo repugnante. Boris Casoy revela o seu pensamento sobre os trabalhadores do serviço de limpeza da cidade. Pensei imediatamente em escrever um artigo sobre o caso, mas acabei enrolando. De hoje não passaria, ainda mais depois de ver aquilo que foi veiculado sobre o assunto nos principais jornais do país. “Bóris passa por uma saia justa”, “o âncora do Jornal da Band se desculpa pela gafe”, foi o que disseram a maioria das matérias que li sobre o assunto. Ora!! Façam-me o favor!!! Esse asqueroso episódio foi só um vazamento daquilo que o tal apresentador realmente pensa sobre a categoria de trabalhadores responsáveis por limpar a cidade onde ele vive e onde com certeza produz muito lixo.

Foi de uma vulgaridade que talvez tenha sido inédita na televisão brasileira. Eu pelo menos tentei aqui e não consegui me lembrar de um comentário tão pesado quanto esse, pelo conjunto de características que carrega. Estamos acostumados às distorções e deturpações da mídia quando se fala em MST, em cotas para segmentos que sofrem com desigualdades étnico-raciais ou de classe, movimento estudantil, outros movimentos sociais... enfim, é comum ver a mídia enviesando os fatos para favorecer seus patrões ou financiadores. Mas o caso de Boris é extremamente mais grave. Isso porque está carregado de muito mais elementos do que o velho preconceito de classe que geralmente vem maquiado. Foi um comentário extremamente covarde contra dois cidadãos simples, humildes, que, no exercício do trabalho, foram interpelados por um repórter que teve a idéia (excelente) de projetar suas vozes para o Brasil inteiro expressando o desejo de um ano novo feliz. Foi muito mais covarde do que as mentiras que a mídia dissemina sobre a classe trabalhadora em movimento. E não chega nem ao nível do preconceito incrustado na sociedade, como é comum de se ouvir, discriminação contra prostitutas, mendigos, bêbados de rua e etc. Foi a ridicularização de um segmento muito honrado da classe trabalhadora destilada igual veneno burguês, de um tapado que não consegue enxergar que aqueles trabalhadores limpam a sujeira que ele mesmo produz.

Olha só o conteúdo dessa verdadeira diarréia verbal: “Que merda.. (risos) Dois lixeiros desejando feliz natal... do alto das suas vassouras.. Dois lixeiros... (risos) O mais baixo da escala do trabalho...” Isso até finalmente ser interrompido por um funcionário do jornal. (Sem contar o erro de concordância) O peso dessas palavras está justamente no que se pode perceber de imediato: Por que isso? Por que é que foi uma “merda”? O que foi que eles fizeram a você ou à sociedade, Boris?

Além de tudo, o apresentador ainda comete um erro de tremenda estupidez. Classificar os trabalhadores da limpeza como sendo “o mais baixo da escala do trabalho”(sic) revela a total ignorância desse apresentador que não se contenta com sua função de âncora, e banca o comentarista de quinta categoria de toda notícia que passar no programa, e assim quer formar a opinião da população brasileira que assiste o jornal. De onde esse asqueroso tirou essa ‘escala do trabalho’? Além disso, vamos testar essa estúpida escala pra vermos. É simples: vamos imaginar o que seria de São Paulo ou do Distrito Federal sem os serviços prestados por esses trabalhadores por uma semana. Não preciso nem comentar. Agora, pra tirar a prova dos nove da estupidez do apresentador, eu proponho: vamos imaginar como seria o bem vindo ano de 2010 sem os infelizes comentários de Boris Casoy?

Pra piorar a nossa situação, todos os jornais que eu tive acesso traziam a matéria de uma forma que, pra mim, se fundamenta no corporativismo. “Boris Casoy pede desculpas pela gafe cometida contra garis no jornal”. Façam uma pesquisa no google, todas as manchetes estão dessa forma. Agora é o que? Boris Casoy é um coitadinho que cometeu um ‘deslize’? É claro que não. No que depender de mim, vai estar evidente pra qualquer um que as palavras de discriminação proferidas pelo apresentador foram sinceras, de caso pensado, e que sem querer vieram a público, humilhando toda uma categoria de trabalhadores em cadeia nacional. É lamentável o corporativismo descarado que quer botar panos quentes em algo tão asqueroso.

Mas se tem uma coisa que não pode passar desapercebida em toda podridão é a dimensão criminosa dos comentários de Boris. Não foi uma gafe, não foi ‘infeliz’, não foi ‘saia justa’ e nem qualquer outro eufemismo. O que foi dito configura-se um crime, injúria, difamação, que causaram danos morais à imagem daqueles dois homens - e mais do que apenas a eles, foi uma ofensa imensurável à imagem de toda uma categoria de trabalhadores, presentes no Brasil e no mundo inteiro.

Eu juro a vocês que quando fui pesquisar o assunto na internet, eu já esperava encontrar todo um rebuliço no sentido de processos contra Boris na Justiça. Pois por esse é o caminho que essa história precisa seguir a partir de agora. Ah se isso fosse com os assistentes sociais...

Mas pra não deixar de fazer a minha parte, mesmo não sendo um gari, eu encaminhei uma cópia desse texto a alguns endereços de sindicatos de trabalhadores de asseio, limpeza e conservação urbana que consegui, na tentativa de muni-los com uma perspectiva crítica de todo esse lastimável episódio, e de encorajá-los a tomar essa decisão de processar o apresentador preconceituoso pelo crime que cometeu.


“Isto é uma vergonha” ??? Não!! Isto é Falta de vergonha! E mais que isso: é um crime mesmo!


Esse fato é o típico fato bombástico de rolar cabeças. E em fatos de rolar cabeças, sempre rolam cabeças. Mas aí eu pergunto, será que vai ser a de Boris Casoy, um dos jornalistas mais conhecidos do Brasil? Mas o pescoço do trabalhador anônimo responsável pelo áudio certamente corre perigo – se não já tiver sido cortado. E esse fato previsível é mais uma demonstração preconceituosa da parte de Boris, que é apenas um representante de um conjunto de homens poderosos que nunca pagam pelos crimes que cometem, mas ao contrário, fazem recair sobre um outro conjunto de pessoas menos empoderado a capa da criminalização. Qualquer semelhança com a realidade atual dos políticos do DF e o episódio do massacre à população manifestante feito pela PM não é mera coincidência.

..Sabe... Eu também queria ser um gari. Mas não exatamente o gari que limpa a sujeira das ruas, mas um gari que limpasse as toneladas de lixo (des)informativo produzido por uma mídia como a que temos no nosso país.




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Movimento Fora Boris Casoy

Olha só a que ponto chegou o caso: eu fui entrar no youtube hoje para pegar os vídeos e postar aqui no texto, digitei apenas youtube.com, e olha só como está a página inicial! Eu nem cheguei a fazer a pesquisa! Já existem dezenas de links para o vídeo, e só um deles que eu vi, ultrapassava as 800000 exibições!

Mandem emails para a Band pedindo que o preconceituoso, o discriminador, para que Boris Casoy suma das nossas Tevês. Acho que não dá pra ficar calado, calada diante dessa situação que é muito mais grave do que a mídia nos quis fazer parecer.

Os vídeos pra quem ainda não viu:




Olhem só a página inicial do youtube quando eu ainda nem tinha feito a pesquisa:




 
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