Somos humanos. E uma das maiores marcas do que é ser humano é a aprendizagem. Talvez venha daí o meu fascínio pela educação. Ao contrário dos demais animais, nós nascemos completamente ignorantes e incapazes, mas nos tornamos conscientes e capazes por meio da aprendizagem. O ser humano é, por excelência, o animal da aprendizagem. Mas a pergunta que faço é: o que isso nos provoca, orgulho ou vergonha?
A nossa sociedade dicotomizou a relação de aprendizagem. Existem aqueles que ensinam e existem aqueles que aprendem. E como já dizia o mestre Foucault, e antes dele o Mestre Jesus, conhecimento é poder. E isso não se pode esquecer, pois, se conhecimento é poder, e os humanos adoram poder, então tem muito mais coisa do que aparenta essa coisa de aprendizagem.
Estou dizendo isso pra mostrar que é essa divisão entre o que ensina e o que aprende não é casual. Mas essa relação revela, ainda, um enorme contrasenso da humanidade: se a grande marca do ser humano é aprender, por que então o que todos querem é ensinar?
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O movimento contra a corrupção é pedagógico. Ele tem ensinado a sociedade de muitas maneiras, em muitos aspectos, aos mais variados segmentos de pessoas. Mas tem um segmento muito importante da sociedade que pode perder o bonde do aprendizado. Falo justamente do grupo maior, o mais presente e responsável pela vida desse movimento. Falo do grupo que poderia chamar de grupo dos movimentos sociais. O que chamo de movimentos sociais aqui compreende partidos políticos, grupos autônomos de luta, de trabalhadores, estudantes, sindicatos, grupos de etnia, gênero, ambientalistas, socialistas, democratas, anarquistas, etc. Os grupos que já estão acostumados a lutar há mais tempo. Boa parte desses grupos está hoje unida num grande movimento social, que é esse movimento contra a corrupção, cuja luta se dá no DF, mas possui repercussão nacional.
E é muito bonito ver partidos rivais construindo
O movimento ensinou que esses grupos, que são separados e às vezes rivais, são mais unidos do que se acreditava. O movimento ensinou que os grupos que lutam ainda são poucos para vencerem sozinhos, e que só a união dessas forças é que pode fazer vislumbrar no horizonte a vitória. O movimento ensinou que dividimos muita coisa, o movimento ensinou que é preciso humildade para ouvir o outro, sendo que o outro é muitas vezes um antigo rival. O movimento ensinou a pôr em questão se nós somos mesmo rivais.
O movimento ensinou? Bom, ele ao menos tentou. Ele foi, e tem sido, mais do que claro nos seus ensinamentos. É o movimento que tanto ensinou aos demais, ensinando lições a si mesmo. Mas temos aí um problema. Para a aprendizagem, não bastam apenas as grandes lições, por maiores que sejam. É um problema que se remete ao que foi discutido no início do texto: Será que o movimento que a tanta gente ensinou está realmente disposto a aprender consigo mesmo?
4 comentários:
Léo... amei seu blog. visitarei mais vezes certamente.
Sobre o artigo, concordo plenamente.
O movimento contra a corrupção tem unido vários movimentos sociais que têm lutas distintas. Mesmo sendo lutas diferentes, existe um plano de fundo comum, histórico de exclusão e exploração...
O movimentos têm ainda, de uma forma ou outra, o objetivo de garantir que os direitos e deveres sejam respeitados e garantidos na sociedade.
Entretanto, esses movimentos sempre se esqueceram dos pontos em comum e deram demasiada importânica somente aos objetivos fins e aos conflitos ideologicos.. enfim...
Talvez a possibilidade de enxergar cada luta distinta dentro de um projeto maior com objetivos comuns, seja uma das lições que esse(s) movimento(s) possa(m) aprender com sua própria experiência.
Gostei do artigo... Muito interessante a sua análise, Leo.
Ao ler o texto e essa relação de ensino e aprendizagem, me surgiu uma questão que tem grandes chances de ser retórica, mas não custa nada colocar aqui pra tentar ampliar o debate: mais que ensinar ou aprender, será que esses diferentes grupos do movimento social não estavam ali mais para afirmar sua posição particular, enquanto grupo, que para ensinar ou aprender algo com alguém? Fugindo à máxima 'junto e misturado'? A finalidde era comum, mas a questão da pedagogia, ali dentro, será que de fato funcionou em algum momento? Acredito na pedagogia que pode ter acontecido em relação àqueles que estavam de fora, assistindo todas essas ações do Fora Arruda, como vc já pontuou. Mas quando eu vejo na TV um militante do PSOL levantar a bandeira no espaço público da rua, no ato "carnaval fora de época", e logo depois ver outros manifestantes puxarem sua bandeira para baixo e gritar para a câmera que o movimento é "apartidário", a pulguinha atrás da minha orelha me dá uma mordida.
Valeu Josi!
E a questão é justamente essa. Um movimento que tanto tem ensinado a todos ao seu redor pode perder estar perdendo a grande chance de aprender. Se somos capazes de nos aproximarmos por aquilo que nos iguala mais do que nos distanciamos por aquilo que nos diferencia.
Pois é, Kamilla,
Isso que você levantou puxou a cortina que cobria a minha aposta nessa história.
O que eu penso sobre tudo isso (mas não necessariamente deixei claro nos textos) é: o movimento é da pedagogia do Chaves, quer dizer, ele é pedagógico mas é "sem querer querendo". O movimento ensinou sem querer. O objetivo desse movimento para muitos dos indivíduos que o compõe é justamente "levantar a sua bandeira". E isso acomete até ao "partido dos apartidários". Uma pergunta simples já serve de teste pro auto aprendizado do movimento: nós somos um movimento, ou este movimento é apenas a soma de movimentos que estão se movimentando para um mesmo objetivo?
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